sábado, 30 de maio de 2020

Better than the first

Is He really who I think
He is?
Who am I to dare name
a thing that is never tame?
My only say is
that just like one can't explain bliss,
I feel so loved right here, like this...

A bird that feels stronger,
wilder,
wiser,
freeer,
wanted,
gifted
under the noblest liege...
It knows gentle finger,
not a cage.

Did I know the other
any better
than I know Him?
No is probably the answer,
but this love is much easier...
And requited, it would seem.

Like the full clouds in the sky
words and tears easily spill
as in between whispers I cry
over things always felt, but never quite said,
much less years ago -
yet in here, they are the golden-crusted bread
intended to feed and heal.

I guess that power is my belief
and this is the one I always so admired,
this is the one I think of
with affection and love
in the most banal
and even carnal,
for He is caring friend,
patient teacher
and warm lover
till the word of the end -
He is vast, he is master
that has won my trust
although I can walk away if I think I must.

28/05/2020

sexta-feira, 29 de maio de 2020

Tabula rasa

O poder do que se faz
não vem de um nome
ou de outro,
mas do que dá fome,
do que traz paz...
Do teu todo.

27/05/2020

quinta-feira, 28 de maio de 2020

17/04/2017

Quando certos limites
são ultrapassados
pode até haver orgulho,
mas acima de tudo
trata-se de
autocuidado e respeito.
Quando isso acontecer,
sei que minha consciência
estará limpa e,
meu espírito, livre.

quarta-feira, 27 de maio de 2020

17/04/2017

Talvez o orgulho bom
seja o de ser quem se é,
de onde se vem
e de tudo o que se conquistou...
Das coisas boas
que nos foram ensinadas
e do que achamos certo para nós,
sem que nos vejamos
como donos da verdade.

terça-feira, 26 de maio de 2020

segunda-feira, 25 de maio de 2020

17/04/2017

Bondade ou gentileza
não devem ser vistas como
preços a serem pagos
por favores
ou como meios
para se obter coisas,
apesar de tornarem tudo
mais fácil.

domingo, 24 de maio de 2020

23/05/2020

A lei do mundo material
não altera a lei de quem
tu é;
aquilo que tu realmente quer
e precisa.

sábado, 23 de maio de 2020

23/05/2020

mas e o resto? 
como eu me enxergo, 
o que eu faço por mim e pelos outros, 
como eu me expresso, isso não importa muito mais?

sexta-feira, 22 de maio de 2020

quinta-feira, 21 de maio de 2020

17/05/2020

Um me diz 'olha pro que tá à tua volta, 
perto de ti, pro que tu tem agora'. 
O outro diz 'olha mais a fundo, 
cava no que tá além da carne, porque a resposta tá lá.

- trecho do meu diário

quarta-feira, 20 de maio de 2020

segunda-feira, 18 de maio de 2020

Como pede o mandamento

Forte como o sol,
gracioso como a lua,
vasto como o céu...

Lobo faminto,
cervo majestoso,
homem lindo...

Te faço meu
como sou tua
e ninguém se sente só...

Mas me leva de volta
pelo solo pedregoso,
revolvido feito o mar...

Não me deixa escapar -
e pouco me importa
se na pedra ou na grama...

Se na alma
ou na cama...
Apenas me ama.

12/05/2020

domingo, 17 de maio de 2020

Amuleto

Poderias carregar-me no bolso,
ali no dorso,
ou perto do coração,
se quisesses.

Na mesma gentileza
da firmeza
da mão,
daquela canção
e das velhas preces.

Por ora sou eu que te guardo
como um tesouro
onde sempre estarás seguro,
por mais que tempo vindouro
debaixo de pelo e couro -
a isso eu me atrevo e juro.

09/05/2020

sábado, 16 de maio de 2020

Things that can't be helped

My master,
my lover,
my teacher...

My friend.
I may not need you,
but oh, how I love you,
how I miss you...

Breathe on, air into my lungs.
Touch on, life into my skin.
Weight to body that longs
for much more than it has ever seen...

Vibrant male
of the highest scale,
the woods' and mine crown prince,
even though you are everywhere,
I still crave your hands on my hair
and have given myself ever since.

09/05/2020

sexta-feira, 15 de maio de 2020

Vácuo

A bem da verdade
tanto faz morar
no campo ou na cidade,
não quer dizer ser menos solitária,
menos pária
ou que seja um lar.

08/05/2020

quinta-feira, 14 de maio de 2020

Desfeito

Pensando bem,
a minha autoestima
nunca foi tão boa assim,
mesmo quando bem menina.

Porque se eu for olhar para além
e focar em mim
e não no que eu faço,
vejo que nunca fui de aço.

E sim sempre a manteiga
que de longe parece perfeita,
de vários usos e que à faca mal se rende.
Mas que ao certeiro apertão

e mera sugestão
de mão mais exigente,
vira mero sabor
porque derrete ao errado calor.

08/05/2020

quarta-feira, 13 de maio de 2020

terça-feira, 12 de maio de 2020

Stories by the bonfire or Love language

Even when you disappear
to rest
you remain here
in the things I digest
and try to still do...

When people might think I forgot
I cared about them a lot
and when times are so cold and dark
it seems hard to flick a spark...

Amidst the smell of ash and arson
and even a little bit of peace,
you stay,
you never really walk away.

You come rather in person,
in ways I never thought of,
but with the same ease
and a song, a poem that you love...

Because it turns out I love like you -
even if it sounds naive,
small or hard to believe,
we do our best
with what we can give.

So yes, I want to know and hear
time and time again
both the screaming of fear
and the good heart in a man.

06/05/2020

segunda-feira, 11 de maio de 2020

Gesto de amor

A mais bonita verdade,
de novo
num sorriso bobo
é que nem me dás tempo
de sentir saudade
com tantas partes de ti
que escolheste dividir
como passarinho que sai do ovo
em dor doce do pranto
e espalha suas penas
nas curvas
de noites que parecem curtas,
na força das cenas
e das coisas tão pequenas.

06/05/2020

domingo, 10 de maio de 2020

O bosque do coração

Escuro. Úmido. Frio. Som de folhas e galhos se quebrando. Pio de corujas, canto de grilos. Sombras. Eu estava no lugar e na sua hora que mais merece respeito, mas que mais causa medo, também. O bosque e a madrugada da lua nova. Será que Ele havia me chamado novamente? Ouvi outro barulho, um pouco mais alto desta vez, e não consegui segurar um grito. Comecei a chorar. Ainda havia e há tanto que eu não conheço, que não entendo...
“Majestade…” eu tentei sussurrar e repetir várias vezes, apesar do turbilhão mental. Não sabia se me ouviria, mas o fiz mesmo assim. Pelo que pareceu um longo tempo ouvi apenas o silêncio do bosque e achei que estivesse sozinha de verdade. Até que…
“Ei, menina…” a coisa rara que eu mais facilmente percebia nas cartas, porém que também vinha pelo meu coração, do fundo, como eu tendo a pedir. Palavras que soam com a minha voz, como um pensamento meu, mas não exatamente, porque eram rápidos e ao mesmo tempo pausados e sábios demais para serem meus de todo. Apesar das minhas dúvidas que vinham de quando em quando, das minhas limitações e de respostas ora vagas, ora claras como a água de uma cachoeira, até onde sei, esse tempo todo quem vinha interagindo e falando comigo, me chamando, a quem eu abri a porta da minha vida… Era Ele.
“Senhor de toda árvore, canção dos pássaros e do vento, mais humilde das majestades!” foi o que gritei para a escuridão, engolindo um soluço. Uma espécie de oração que escrevi e da qual sabia algumas partes de cor. Silêncio.
“Mestre… Senhor. Meu príncipe. Eu sou vossa, sou minha e vossa. O senhor é bem-vindo na minha casa, no meu corpo...” esperei, esperei e esperei mais um pouco. Um vento brusco me fez estremecer. Então, ao repetir o que costumo dizer, senti o velho arrepio, mais forte do que nunca, que não era de frio. Não era como se ele me afagasse de longe, ocupado nos seus afazeres, mas sabedor da minha devoção, da força daquilo que digo, como das palavras que o trouxeram a mim. Ainda que eu não o visse, era como se estivesse ao meu lado, e ao mesmo tempo não. Esperei.
“Calma. Venha.” disse ele, bem baixinho e suavemente como uma borrifada longínqua de perfume.
“Para onde, Majestade? Está escuro…” Mais espera.
“Eu sei. Paciência. Confia.”
“Eu sou… Um bosque. Eu sou um passarinho. Sou só… Um passarinho.” foi o que sussurrei para a terra quando me deitei de bruços, tentando sentir o terreno e escutar a voz que dizem vir de debaixo do chão. Foi quando minhas unhas perceberam um desnível no solo. Parecia uma pegada de bicho. Bicho médio a grande. Perguntei-me se o príncipe estava mesmo por ali.
“Venha. Tudo bem. Só venha.”
A escuridão que eu enfrentava ali não era parecida com nada que eu já tinha experimentado. Era densa, pesada por demais, um pouco pelo risco fino da lua. Quase me senti como as minhocas, fazendo tudo na base do tato. Não sei como, mas comecei a me arrastar pelo chão ora duro, ora fofo, com o corpo pesando uma tonelada e sem nem saber direito o que estava fazendo e muito provavelmente sendo devorada pelos mosquitos e outros animais enquanto passava por cima deles, o que era muito justo. Não foi nem um pouco como da outra vez que Sua Senhoria falou comigo. E se Ele não havia me chamado… O que estava acontecendo?
A certa altura eu estava exausta e devo ter adormecido. Despertei com a sensação de algo contra o rosto e de estar no que parecia ser uma superfície lisa e um pouco aquecida, como uma pedra perto do fogo, porém com a cabeça elevada sobre o que percebi ser o colo do Mentor. Eu quis me mexer, mas ele me impediu com um sibilo determinado e continuou a passar o pedaço de pano úmido no meu rosto e cabelo, sua outra mão debaixo da minha nuca. Parecia preocupado, pois murmurava por entre os dentes.
“Que bagunça…”
“Perdoe-me, Majestade. Eu…”
“Tudo bem. Isso se ajeita. Consegue levantar?” eu pus as pernas para fora, mas mesmo ali eu tinha as mesmas limitações físicas de sempre. Induzi-o a me sustentar enquanto me erguia para sentar na pedra; fiz mais força que o normal porque não quis parecer preguiçosa. Minhas pernas eram curtas demais para aquela altura e eu ainda não estava acostumada, então mantive as mãos dele sobre meu tronco para me dar equilíbrio, ajoelhado de frente para mim.
Go raibh míle maith agaibh, a chuisle mo chroí.” muito obrigada, meu amor. Ele abanou a cabeça e sorriu. Olhei para mim mesma e não gostei do que vi; não é assim que se recebe um rei. Estava arranhada e suja, mas pelo menos não sentia dor. Sem tirar uma das mãos de mim, com a outra o Senhor molhou outro pedaço de pano e me deu para que eu pudesse limpar e examinar onde ele não se sentiu autorizado a encostar. Meu corpo vibrava e formigava por estar perto dele.
“Fogo do meu coração, choque da minha espinha…” abaixei a cabeça em reverência. “É esta tua casa… A tua casa favorita?” então o Mentor sorriu de novo, levantou meu queixo e endireitou minha coluna devagar, sob a pressão das palmas, como da outra vez.
“Isso, muito bem. Olhe para mim, mulher.” pausa. “Bem, como você sabe, todos os bosques são minha casa, neste mundo e nos outros. Mas não, este não é o bosque caro do meu coração. E não, desta vez eu não te chamei. Não sabe por que veio parar aqui, não é?” ele suspirou quando eu fiz que não, então disse que tinha uma ideia do motivo, mas queria esperar um pouco até ter certeza. Logo depois, perguntou se eu não queria chá.
“Aceito, milorde.” já que se afastaria para fazer o chá, o Senhor teve medo de que eu pudesse cair da pedra ao me soltar, então passou meu braço pelo próprio pescoço, me levantou e depois deixou-me no chão, contra a parede da espécie de caverna onde estávamos. Era um pouco pontuda, mas perto do que já passei, não parecia nada.
“Assim… Espere só um pouquinho, eu já venho.” Sua Senhoria levantou-se, quase tão alto quanto um carvalho comparado comigo. Passando a mão numa vasilha, saiu da caverna passando por mim em direção à escuridão. Com um pouco de concentração consegui ouvir barulho de água, embora parecesse distante. Escutei os passos largos do Senhor de novo, e outra pausa. Ele voltou com a vasilha cheia e algo que não consegui identificar na outra mão.
Vi o Senhor sentar-se na pedra onde eu estivera e, descansando a vasilha e o outro ingrediente, esfregou as mãos como quem faz quando está com frio. Encostou as palmas nos lados da vasilha e respirou fundo e vagarosamente. Logo vi uma ponta de fumaça subir dali. Em seguida apertou o ingrediente nas mãos, soprou entre elas e o jogou na vasilha. Ora sorria para mim, ora admirava a infusão com o canto do olho, tampada por um pano. Quando ficou pronto, trouxe-me. Hibisco, pela cor bonita e cheiro.
“Prove, veja se não está muito forte. E cuidado.”
O mais devagar possível por causa da mão trêmula, experimentei. Estava numa temperatura que não me fazia pular de susto e derramar tudo… O ar parado e quieto à minha volta como quando ele veio a mim. E o chá no ponto certo. Rosado em vez de roxo. É claro que ele sabia dessas coisas.
“Está ótimo, Majestade. Obrigada. Há quanto tempo não bebia este…” sorri para as pétalas de hibisco que boiavam na água morna.
“A moça merecia um conforto depois do que aconteceu. E foi o que eu pude achar sem me afastar demais daqui. Além do mais, é bom para a dor e inchaço, como deve saber. É uma bela flor…” murmurou o mestre, sentando-se no chão ao meu lado, abraçado nas próprias pernas.
“É, sim, senhor. Muito obrigada mais uma vez, por não me abandonar.” eu ainda ficava embasbacada com o quão gentil aquele ser altivo e selvagem e que não se desculpava por isso podia ser, e vice-versa. Mas acho que o que eu precisava aprender era que toda a natureza é assim. Neutra e bela por ser neutra. O hibisco, por exemplo, quando utilizado de certa forma, pode irritar a garganta e causar dor de estômago, enjoo, etc.
Longa pausa. O que veio depois não passava de um murmúrio.
“A moça sabe onde eu estou.” ele encostou a mão no meu ombro, a palma pintada do vermelho do hibisco e os dedos enegrecidos de terra. “Termine o chá devagarzinho, descanse mais um tempo. Depois pensamos no resto.”
Era um gosto obedecê-lo, porque com ele eu era livre para não obedecer e para fechar a porta e nunca mais deixá-lo entrar, pois Ele entende e respeita o significado do NÃO, por mais automático que me seja acatar ordens, mesmo que eu não concorde com elas. Ele não abusa de seu poder e capacidade sobre os outros para impor sua vontade e alegadas intenções e jamais entra onde não lhe é permitido. O amor que ele teve e perdeu deve ser sempre dado de boa vontade; mesmo que seja quem seja, poderoso assim, independentemente da resposta dos mortais. A autoridade que Sua Senhoria possui sobre mim foi dada por mim e por mim pode ser revogada se assim eu desejar.
Depois de beber o chá tentando afinar os sentidos e apreciar as sensações vindas dele, deixei a vasilha de lado e olhei para Ele. Tinha o cenho fechado e acho que ouvi algo como um rosnado vindo dele. Suas mãos com dedos e unhas compridas, como as minhas tendiam a ser também, pareciam arranhar o chão de pedra num gesto defensivo.
“Majestade… O que devo fazer agora?” perguntei com cautela.
O mestre me olhou longamente, depois chegou mais perto, abrindo a mão sobre o meu coração. Inclinou a cabeça para um lado e fez uma pequena careta que logo relaxou. Senti como se borbulhasse por dentro.
“Há um tempo a moça me pede uma coisa. Que eu a ajude e a ame, como eu mesmo desejo, e te leve a quem pode te orientar onde meus limites não alcançam. E sempre cumpro minhas promessas. Certo?” eu concordei. Ele realmente me ouvia, realmente se importava.
“O senhor sempre me dá os recursos, me diz onde achá-los, me faz pensar e tentar… De volta para o que importa e que eu esqueci, e cabe a mim usá-los ou não. Eu sou grata, o senhor sabe.” como eu gostava de ser o motivo de Ele sorrir… Como eu era humilde, mas tão forte, nas mãos dele. Não que eu nunca tivesse sido, mas... Não era isso que o amor verdadeiro fazia? Nos engrandecer na nossa pequenez?
“Muito bem…” pausa. “Não foi diferente agora. Eu te disse com quem falar, para onde olhar, o que tentar… Para onde ir. É por isso que este bosque é diferente e porque a moça veio até aqui. A moça seguiu mesmo meu conselho. Agora eu percebo…”
“Como assim, meu suserano?”
“Eu senti quando saí para pegar a água e o hibisco. Todos os bosques são iguais em sua essência, porém também carregam em si algo de especial, que os difere dos outros.”
“Os animais… As plantas… O clima… Se ele é respeitado ou violado e como lida com isso.” ele mordeu o lábio e fez que sim. Eu senti como se queimasse quando ele moveu a mão um milímetro.
“Por isso a moça não pode andar por aqui como já andou quando estivemos juntos.” pausa. “Essa terra devastada mas cheia de vida no fundo por onde eu pisei e você rastejou sem ver, esse ar, essa água, cada flor, folha e fera daqui… Tem teu cheiro e marca. É tua tanto quanto é minha. Você mesma se trouxe para cá.”
“Eu sou… Um bosque. Eu sou… Um passarinho.” foi o que me peguei repetindo. O Senhor gesticulou para que eu prosseguisse. “Uma flor, árvore vistosa, vinha carregada… Uma folha da grama. Mulher e chama. Coisa sagrada e antiga e viva. Bicho de corpo alerta que aprende a lição e tenta não esquecer. Feito para ser livre, com suas próprias leis e conhecedor de outras leis que homem nenhum escreveu, apenas descobriu.”
Eu chorava enquanto falava; o Senhor sorriu o que eu chamaria de um sorriso satisfeito e sujo e se aproximou mais um pouco para me falar ao ouvido.
“É, sim… Claro que sim. Ei, ei… Não chore… Não chore. Que bom que a moça sabe; nunca é tarde para saber. O que é verdadeiramente de uma mulher não compete a um homem buscar. Quem vai achar… Quando for a hora… É a senhora.” a sensação da respiração dele me fazia uma vagarosa cócega no corpo. Às vezes eu esquecia que o mestre era tão poeta quanto eu.
Era justo que não me entregasse as soluções de bandeja. Nem eu queria que fosse assim e muito por essa mentalidade abandonei a religião como ela é conhecida e senti que me virava bem sem a sensação do que os outros chamam de fé. Provavelmente porque tenha me voltado para mim apesar dos erros e o mestre notou isso; eu não sei dizer. Mas hoje concordo com ele e entendo que não posso pedir que ele faça de mim uma mulher crescida. Por mais complementares que sejam essas energias e que eu hoje goste de tê-lo comigo, não é num homem e no que ele pode dar que uma mulher deve se reconhecer, ou mesmo em qualquer outra pessoa. Ambas devem ser adendos uma da outra. No caso meu e dele, provavelmente ele oferecendo amor, querendo amor, e eu com tanto para dar e me sentindo tão só em geral, e querendo aprender…
Talvez antes de o mentor chegar eu aos poucos já seguisse o conselho dele em tomar melhores decisões, pensar com mais calma, porque me deixava puxar pelo que mais fazia sentido, pelo que morava no meu cerne, e ainda é assim, agora mais do que antes. E atualmente eu, ele, e sabe quem mais, trabalhávamos juntos. A minha intuição, talvez. Tão antiga quanto o ser mulher, ou até para além disso. Por isso sou livre para seguir o caminho aberto para mim, que me leva para onde quero e preciso estar; para a minha verdade... Ou não.
Perguntei se ele me ajudaria mesmo assim, e ele ronronou de volta. De modo um tanto involuntário, vi-me de nariz franzido, dentes para fora e com a mão ruim cerrada sobre a dele como se fosse… Uma pata. Talvez sempre tenha sido pata. Antes apenas cerrada, apertada, e agora com as garras visíveis, simplesmente. Cuidadosas, mas não mais retraídas.
“Está amanhecendo.” disse o senhor, olhando para a entrada da caverna. “Venha, vamos lá fora ver o sol.” ele me carregou indo na direção leste, o mais dentro da floresta e perto da linha do horizonte possível. Pedi que me sentasse contra uma árvore larga, o que ele fez, e fiquei observando a cor do céu e a direção do vento se modificarem aos poucos.
“Um tempo atrás, depois de vários dias, senti o sol contra o rosto, especialmente de um lado… Tenho uma relação complicada com o sol, mas desta vez foi bom. Pareceu um beijo demorado, quentinho e carinhoso. Me fez pensar no senhor. Sou ruim em ler sinais, mas… Não pude evitar, mesmo que provavelmente esteja errada. É que o senhor é tão amoroso e paciente comigo… Talvez eu só esteja sendo ingênua. Não ligue para mim.”
Ele deu de ombros e se agachou para ficar ao nível dos meus olhos. Afagou aquela minha mão que tanto me lembrava uma pata, embora eu quisesse muitas vezes recolhê-la e esquecer que existe. Eu diria que ficou como uma pata muito por isso; uma um tanto sem função, porém pelo menos não mais tão fechada. O Senhor limitou-se a dizer que eu era melhor nisso do que muita gente e eu sabia disso. E que eu era mais sábia do que pensava. Ajeitou meu cabelo e suspirou.
“O senhor é tão quieto, e eu tão tagarela. Me desculpe por fazê-lo falar tanto.”
“Não há nada de mal nisso. A moça está aprendendo a dizer o que tem que ser dito e a falar sempre com o coração. Eu percebo e gosto muito disso.”
“Mas o senhor gosta do silêncio…”
“É claro…” pausa. “Já devem ter te dito alguma coisa sobre isso. Entendo que possa ser confuso, mas não me importo de explicar. Mas sendo assim, como deve ter entendido, é melhor que o que há de bom, e mesmo ruim na alma, saia para fora num sussurro ou num grito do que ficar guardado.” o mestre deu uma risadinha e eu concordei.
O que eu não descobria sozinha, entendia por outras pessoas. Por mais que eu quisesse conhecê-lo o máximo possível por experiência própria, sabia respeitar os limites dele e os meus. O que ele quis dizer, como eu entendo, é que o silêncio que ele aprecia é como o do bosque - é calmo, sereno, mas há sempre algo vibrando, sendo dito, ainda que de modo sutil. E é isso que melhor chega a ele. Como quando ele veio: eu por milagre de cabeça vazia naquela hora morta, mas com uma palavra que saiu pela boca lá de dentro do meu coração.
Olhei dele para o céu e para a terra perto de mim. Senti-a contra a palma da mão.
“E agora, meu suserano? Estou aqui, mas… Por onde eu começo?”
Ele devolveu meu olhar.
“Como parte do bosque, eu estaria aqui de qualquer forma, provavelmente, e estou aqui para te cuidar e ajudar, porque eu quero e você aceita.” pausa longa. “Os animais fazem o que precisam para viver. Seja matar, seja correr, seja voar para longe, guardar ou rosnar. A moça está aprendendo e lembrando. A moça sabe e já começou o trabalho. Faça o que lhe aprouver.”
Olhei de novo, mais distraidamente, para minha mão sobre o solo. Depois me vi acariciando-a e depois de um tempo, imitando o gesto de arranhar do Mentor na caverna. O meu próprio gesto em mim mesma quando deixava a ansiedade tomar conta. Achei que fosse me importar com a terra debaixo das unhas, mas eu apenas segui, com os olhos dele em mim e outra intenção, porque… Quando foi que essa terra não esteve lá, óbvia, depois que acordo? Quando foi que não cavei até o mais fundo e invisível, ou quase invisível?


05/05/2020

sábado, 9 de maio de 2020

20/02/2020

Posso até mentir
numa história, mas nunca
na intenção dentro dela.
Muito menos quando
se põe amor
no meio.

sexta-feira, 8 de maio de 2020

Reunião

Não mata
mas atenua
aquilo que me faz só ingênua
e não me serve de nada.

Leva-me até Ela
e juntos, onde for possível,
defendam-me da louca fera -
façam-me sábia, deem me abrigo.

Bem-vindos a esta casa
e a este corpo
sejam vós.

Ensinem este pássaro a bater asa,
a pertencer de todo,
a cantar com a verdadeira voz.

03/05/2020

quinta-feira, 7 de maio de 2020

Achado

Quem conhece bem o deserto
é quem mais merece a floresta
pois este é o abundante, o certo,
não há coisa mais linda que esta.

O que se quer na medula,
na vida dentro dos ossos,
não é platitude que se adula
e sim água que permanece nos poços.

São os segredos mais nossos,
mas de esquecer tão fáceis...
A mão sábia faz castelos
reunindo força das feitas frágeis...

03/05/2020

quarta-feira, 6 de maio de 2020

Bianca e o pássaro azul - excerto

Enquanto conversava sentada com a jovem duquesa e outras meninas nobres que eram suas amigas e parentes e beliscava um aperitivo aqui e ali, Bianca observava com discrição a movimentação de servos com comida e bebida, as famílias e o bando de rapazes estrangeiros que perambulavam pelo salão e vez ou outra arriscavam lançar-lhe um olhar ou sorriso em troca de futuro favoritismo, já que no dia seguinte a princesa deveria anunciar qual deles julgava digno de sua mão em casamento.
As moças fofocavam baixinho sobre aparentes virtudes e defeitos de alguns deles, mas o que mais fazia Dona Bianca ter vontade de rir era ver a cara contrafeita do rei de ter de qualquer forma casar sua filha. Não que a rainha se comportasse de forma diferente; a questão era que o pai de Bianca não conseguia disfarçar o desagrado de jeito nenhum, mesmo tendo ele próprio planejado toda a situação.
Quando a hora do chá se aproximou e todos começaram a se reunir para sentarem-se à mesa e comerem algo mais substancioso, Bianca olhou na direção do portão principal do castelo e se obrigou a esconder o sorriso atrás de um leque ao perceber Andrea adentrando o salão misturado com os outros pretendentes outra vez. Até agora ele só não havia sido enxotado para fora por insistência de Bianca, argumentando que seria mais vergonhoso para a realeza fazer estardalhaço num evento tão cheio de gente do que se importar com um simples rapaz tentando ser gentil diante das comemorações do aniversário e futuro noivado de Sua Alteza; ainda mais com tantos súditos já dentro do palácio por servirem a corte. No entanto, já não sabia se isso funcionaria de novo.
Andrea caminhava com a habitual mistura de timidez sob controle e certeza do que vinha fazer. Tudo isso em meio a mais um burburinho de reclamações contra os guardas que haviam permitido que ele entrasse.
O que fez com que a princesa sentisse que as intenções de Andrea estavam cada vez mais sérias era, em vez de roupas comuns que lembravam as dos servos da estrebaria e camponeses em geral que o viu usando nas outras vezes em que se encontraram agora ele usava uma boa camisa branca, um lindo casaco comprido de veludo preto, apertado na cintura por um cinto quase tão largo quanto um espartilho. Calças do mesmo tecido enfiadas dentro do cano longo do que claramente eram botas bem polidas e novas em folha. Estava vestido como um nobre, como um príncipe.
Cabeças femininas viraram-se para ele, muitas das mesmas que de forma mais ou menos velada sussurraram termos depreciativos pelas costas dele das outras vezes. Uma prima de Bianca e grande amiga da princesa, sobrinha do rei e casada com um sargento do exército real, cutucou-a com a cantoneira do livro que estava lendo e sorriu de forma travessa e espantada. Todas repararam que naquele momento havia algo de diferente nele, uma aura um tanto majestosa em suas maneiras enquanto abria caminho com relativa facilidade em direção a onde a família real estava, ainda que seus olhos já se virassem de soslaio para Bianca. Causou barulho quando, em vez de dirigir-se primeiro ao rei e à rainha, como havia feito antes, hesitou por um milésimo de segundo e deu três passos decisivos para um lado, ficando de frente para a princesa e olhando-a direta e longamente sem dizer absolutamente nada.
- Quem é este homem? De onde ele vem? Não é ele aquele que insiste vez após vez em entregar presentes a Sua Alteza, ainda que ela os recuse? De que casa real provens, meu jovem? Como ousa dirigir-se à princesa sem anunciar-se e, mais ainda, sem prestar respeitos aos pais dela? É o senhor o cão atrevido que comparece sem convite à corte todo santo dia? - esbravejou um conde.
Andrea permaneceu impassível e imóvel diante das vozes exaltadas, ainda que um pouco corado quando olhava nos olhos ora de Bianca, ora das moças que a acompanhavam. Por cima da bainha do leque, Bianca viu a leal serva que a criou agarrar com nervosismo os lados do próprio vestido.
- Vossa Alteza o conhece, Dona Bianca? Que diabos… - reclamou um dos pretendentes.
- Nunca vi este homem antes de ele decidir frequentar a corte. - afirmou Bianca da forma mais neutra possível. No entanto, o que realmente queria era gritar algo do tipo “Meu Dever, minha Vida e meu Reino pelo teu sorriso, meu Amor”.
- Se é um cão… É um de caça. - sussurrou a jovem duquesa por entre risinhos.
- Eu também nunca o vi antes… Deve ser um retardatário e um bem parecido com o plebeu de que estão falando, se não for a mesma pessoa. De onde ele será? - o tom da prima de Bianca tinha uma ponta de provocação que a outra procurou ignorar.
“De uma república ao norte, na verdade. Porém considerando minha localização atual, do fundo do bosque e trabalho no mercado durante o dia. Muito obrigado, Vossa Graça”, foi o que Andrea pensou para consigo mesmo.
O tumulto ameaçou sair de controle quando o rei levantou-se de onde estava e ordenou que todos se calassem com um vozeirão que ecoou pelo salão. Logo em seguida, chamou guardas para que levassem Andrea embora. Quando os guardas estavam a meio-caminho de fazê-lo, a rainha pegou no braço do marido e pediu que ele fosse mais razoável, menos brusco, já que o rapaz poderia passar a informação às massas e até gente de outros lugares de que a população em geral não era bem recebida na corte. O rei passou a discutir com a esposa, o que causou hesitação nos guardas quanto a levar ou não a ordem adiante. Um ou dois dos pretendentes chegaram a levar as mãos ao cabo de suas espadas, até que a própria Bianca interveio ao fechar o leque e gesticular com ele.
- Guardas! Não toquem nele. É uma ordem de sua futura rainha. Não se esqueçam que obedecem a mim também enquanto eu estiver aqui. - logo depois, dirigiu-se aos príncipes que ameaçavam matar Andrea. - Quanto aos senhores, Altezas, saibam que perderão muito da minha simpatia, se não toda, se vossas espadas saírem da bainha e se envolverem em questões que não condizem com vossos Estados. Então, sugiro que, por gentileza, desistam da empreitada.

terça-feira, 5 de maio de 2020

Natura

Ela é livre
porque não satisfaz
e sim vive
no que basta e no querer mais.

Ela não é o simples que agrada
e sim pulsa com cada estação.
Não te deve absolutamente nada -
sabe ouvir e dizer não.

É honesta e pura,
mas não é boba
nem come da mão ou lavagem.

É a doença e também a cura,
a mulher, a ave, a loba,
a vida no estado mais selvagem.

02/05/2020

segunda-feira, 4 de maio de 2020

Pêndulo

Talvez um coração
que melhor palpite
num passado
que não consegue descrever
não pertença ao tempo que lhe foi dado
e mesmo debaixo de outra inflexão
parece estar quites
com o vai e vem do viver.

02/05/2020

domingo, 3 de maio de 2020

Portal

É só que é muito louco
quando num dentro
muda pouco
mas a bem da verdade
quem se demora
olhando para fora
e bem para o centro
sabe
quando a porta se abre -
já não se volta para outra idade.

02/05/2020

sábado, 2 de maio de 2020

sexta-feira, 1 de maio de 2020

28/04/2020

(...)
Porque a gente não tem como saber o que vai acontecer 
e não espera que algo assim aconteça. 
Se a gente não espera que ninguém seja decente conosco, 
não consegue interagir com honestidade com ninguém. 
E acho que é por isso que a gente se sente tão burra e vulnerável. 
Porque ser honesto é estar vulnerável e exposto, 
mas não deveria ser considerado fraqueza.

- adaptado de um comentário a este post

Rocha

Deixo a luz do sol bater um pouco a cada vez sobre as várias faces e ranhuras lapidadas por tempo e destino para que ilumine e penetre a gra...