Aqui estou eu outra vez. Arrebatada nova e talvez irremediavelmente pelo cinema jovem, detalhista, introvertido e, acima de tudo, humano e destemido do também jovem diretor, ator e roteirista quebequense Xavier Dolan.
Como já conhecia seu trabalho através de outros filmes, no caso "J'ai tué ma mère" e "Les Amours Imaginaires", esperava de sua mais nova e premiada joia, "Juste la fin du monde", nada menos do que o habitual - cuidado aos detalhes, silêncios que gritam e verdades latentes na superfície e debaixo do texto do próprio Dolan.
"Juste..." é o frescor do cinema quebequense combinado ao peso de um elenco francês que começa com Gaspard Ulliel como o protagonista Louis, passando por Marion Cotillard, a efervescente Léa Seydoux, Nathalie Baye e Vincent Cassel. Acho que não poderia dar em outra coisa que não uma Palma de Ouro no Festival de Cannes de 2017, em meio a aplausos e ovações após a exibição.
Talvez mais do que nunca Xavier tenha mergulhado no silêncio. O significado simbólico das poucas luzes e cores utilizadas, em sua maior parte escuras e tons de azul, contrasta com o caos vivido dentro da casa onde a ação ocorre e na mente de cada personagem.
O trailer engana. Sugere que apesar de tudo, aquele era um reencontro, um almoço em família, que algo de bom poderia acontecer e ser revivido, afinal. Não era o fim do mundo.
Quando, na verdade, tanto já havia morrido e haveria de morrer; tantos mundos já haviam se acabado.
O que será que pesa mais? Tudo o que é dito nas frustrações e medos; o que na verdade está por baixo dessas palavras; o que não se diz com a voz porque com ela não há nada mais a ser dito; ou o que não é externado, na espera do momento certo que nunca chega? Momento certo que não existe?
No fundo a gente sabe que quando muito tempo passa e nada se faz, muito se perde. Pessoas podem não se conhecer de jeito nenhum, ou apenas como uma ideia; outras que acham que se conhecem, arranham na verdade apenas a superfície uma da outra. E mesmo num contexto assim pode haver entendimento, respeito e consideração, de onde menos se imagina.
O que poderia unir as pontas soltas, nem que fosse por um momento, na realidade só contribuiria com a dor e a bagunça, porque em muitos sentidos já era tarde demais. O arrependimento e o amor não mais seriam o suficiente.
23/03/2018
Letícia Bolzon Silva; graduada em Relações Internacionais pelo Centro Universitário UNINTER e Especialista em Tradução de Inglês pela Universidade Estácio de Sá. Escritora de prosa e poesia, redatora e tradutora freelancer.
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